Nunca aqui...nunca ao alcance
Posso andar, correr...parar...
Tu não o permites
Sempre o ocultas de mim
Por que tornas contra mim a tua mão?
Se ando errado, por que não me corriges?
Tens prazer em ver-me assim, perdido,
Tropeçando, caindo e ferindo-me?
De que adianta sondar e expor
Se conservas-me como sou?
A cada dia pioro e apodreço
Até quando o esconderei?
Ou queres humilhar-me diante de todos?
Vivo aterrorizado, imaginando o dia
Em que já não poderei esconder minha nudez
E todos verão o que só nós conhecemos
Acaso é este o teu plano? Não te importas mais
Que tenha tomado Teu nome sobre mim?
Ou tens Tu prazer em minha destruição
E jubilarás no dia da minha vergonha?
Já não sei mais para onde olhar
Em todo lugar, só vejo trevas
Prostro-me, abro os livros
Mas nenhum resplendor encontro
Dizem "és rico", mas o ouro não brilha
Sirvo-me à mesa, mas continuo com fome
Bebo até a água escorrer dos lábios
Mas minha língua permanece cheia de sal
Se não sou pobre, onde está a minha riqueza?
Se não sou cego, por que não há luz?
Se tenho o pão e a água que são vivos,
Dize-me, Pai: por que sinto tamanho vazio?
Restam-me apenas as vestes
Mas já sinto as mãos a me agarrar
Prestes a tomar o meu manto
E a expor, enfim, a minha miséria
Que posso fazer-te, se minhas obras são imundas
Se não há como apagar o que se passou
Se a sujeira mancha tudo o que toco
E bem sabes o que há dentro de mim?
Não és tu o Salvador? Não resgatas os que estão perdidos?
Por amor de Ti mesmo, tira-me da ilha do meu exílio
Dai-me o que tanto busco, o que tanto anseio
Dai-me o tesouro que necessito receber
Ou, então, cerra sobre mim tuas mãos
E arranca-me enquanto ainda são poucos
Os que viram a minha nudez
Enquanto não há quem Te deixe por causa dela